Antes de mais nada, quero agradecer o maravilhoso presente que ganhei esta semana do meu amigo Edu Coxinha! Bacana ser lembrado por uma pessoa que, na verdade, nem conhece a gente pessoalmente. Coxinha, é como te falei por e-mail, quero fazer parte desta tua turma mopariana aí, mesmo que à distância!! Abração.
Semana passada, mais precisamente no sábado, levantei bem cedo e fui para o porão da minha casa. Lugar este, em que aos poucos, estou transformando em um reduto de carros e peças, meu antiquário particular. Neste lugar, pretendo passar boa parte da vida que me resta. Bom, por enquanto, está uma bagunça generalizada, mas, passei a manhã inteira arrumando coisas, organizando e catalogando peças ainda não inventariadas. Acredito que no máximo em dois anos, esteja tudo do jeito que eu quero.
Quando faço isto, esqueço da vida, de tudo e de todos! As horas passam em um piscar de olhos. Por alguns momentos, me sinto como uma ostra, vivendo em um mundo à parte, fechado, rodeado pela matéria, que a tantos anos, não faz mais parte da grande maioria da sociedade.
Não raras as vezes, em que pego alguma peça e, imediatamente, retrocedo décadas. Algumas até lembro de onde sairam, de carros doadores, ou novas, de alguma agência falida. Penso o quanto era boa a vida passada. Talvez esta seja uma das inumeras explicações de o porque venho guardando tantas coisas.
Mas, por vezes, por mais que me de "raiva", tenho lapsos de lucidez. Penso nas palavras do meu falecido sogro, sr João, que foi um homem, assim como eu, que passou a vida inteira acumulando e guardando suas preciosidades. No caso dele, madeiras nobres! Ao chegar no fim da vida, já bem perto de sua morte, seguidamente eu o escutava dizer uma frase pesada:"- Tudo é uma ilusão!" Os bens materias são como areia no deserto, não valem nada! No caso dele, aconteceu o óbvio, quando morreu, tudo foi vendido. Até não condeno, pois tudo aquilo tinha muito valor para ele, que conhecia e gostava. Aí me pergunto, vale a pena o que estou fazendo? Dedicando horas, dias, semanas, meses, anos... minha vida toda!!!??? Para, talvez, logo após minha morte, vir alguém e vender, a rodo, tudo para desocupar o meu lugar sagrado!!
Bom, continuando com aquele sábado no porão. Quase meio dia, minha mulher me chama para almoçar. Subo até a cozinha e a Valquiria me diz:"- Sabe quem morreu? E eu, quem?? O teu amigo Plinio Kellermann!"... ... fiquei em silêncio e novamente me veio as palavras do meu sogro!
O seu Plinio, além de meu amigo, foi um antigo cliente. Nos idos anos 80, foi proprietário de um dodge dart, marrom, ano 1974. Não foram muitas as vezes em que negociamos, digamos, de uma maneira normal. O sr Plinio sempre foi uma pessoa simples, de poucos recursos, não tinha como gastar. Mas, quase que semanalmente, ia até minha oficina para conversar, não tinha dinheiro, mas tinha o que falta em muitas pessoas, humildade!
Talvez por pena, altruísmo, ou na pior e mais feia das hipóteses, para me sentir importante, perdi a conta de quantas vezes coloquei peças de reposição em seu dodge e não cobrei nada! Pensando hoje, um preço justo pela sua agradável companhia. Por outro lado, como é bom poder ajudar alguém que realmente precisa?? Não tem preço!
Sei que existem muitas pessoas que falam mal de mim, e até entendo, como eu sempre fui muito careiro com minhas peças, e neste mundo, sempre houve gente muito petulante e sem condições de ter um dodge, esta relação, logicamente, não poderia dar certo. Mas a parcela de gente boa prevalece, haja visto os exemplos que conheço!
A minha esposa me acha muito parecido com o pai dela, meu falecido sogro. Adorava as coisas que tinha, para os humildes dava até de presente, para os prepotentes e arrogantes, cobrava o dobro do que valia, ou até mesmo não vendia! Eu não nego, sou bem assim! Crista empinada nunca se criou comigo.
Bom, o sr Plinio rodou com este Dart por anos e anos a fio, todos os dias! Praticamente sem manutenção! Até que certo dia, eu uma das visitas que me fez, me disse para ir buscar o Dart em sua casa. O carro estava acabado, motor ruim, caixa idem, lata nem se fala! Não dava mais para rodar! Perguntei a ele quanto queria pelo dodge, ele sabia que o carro iria ser desmanchado, e muito pouca coisa eu iria aproveitar. Então me disse:"-Metade deste dodge é teu, pelas inumeras peças que tu colocou pra mim e não cobrou! Me paga o que tu quiser e achar justo!" Sem querer me vangloriar, paguei muito, mas muito mais, do que o carro valia. Com o que eu paguei pelo dodge, seu Plinio comprou um Fiat 147, na mesma semana. Bom, mas a história deste carro fica mais pra frente.
A praticamente dois meses atrás, estive na casa dele fazendo uma visita. Sua esposa já havia falecido à três anos, seus dois filhos moram muito longe, só o visitavam em datas especiais. A mais de dois anos ele não caminhava, vivia sozinho em sua casa. Lembro que quando entrei na casa dele, estava sentado no sofa da sala assistinto TV. Ao me ver, abriu um enorme sorriso e disse:"-Qua alegria em te ver aqui!! Ninguém me visita!!!" Que frase dolorosa, meus ólhos se encheram de lágrimas naquele momento! A vida do solitário é cruél!
Conversamos por quase duas horas, assuntos dos mais variados. Eu sempre puxando pelo passado, sempre ávido por detalhes da vida de antigamente. Isto para uma pessoa idosa, é a glória, pois lhe remete ao tempo em que foi útil para a falsa e imoral sociedade em que vivemos. Tudo que uma pessoa velha anseia ardentemente, é alguém que lhe escute! Depois de muita conversa, prometi a ele que voltaria para uma nova visita, que infelizmente, não fiz! Perdão Plinio!
Taquara é uma cidade relativamente velha para a região onde se localiza, foi um dos primeiros município do vale do Paranhana, se não me engano, o primeiro. Nos seus quase cento e quarenta anos, muitas coisas se passaram pela cidade, muitos comércios, cinemas, etc. Taquara foi por muitos anos o centro comercial dos municípios que a circundavam. Quando algum morador dos municipios vizinhos precisavam fazer compras diferentes, vinham a Taquara. Como aqui era um pólo comercial, não poderiam faltar as agências de automóveis. Taquara teve praticamente agências de todas as marcas.
A agência Chrysler ficava na avenida Sebastião Amoretti, número??. Como meu pai era cliente da agência Chevrolet, eu não tinha muito contato com a loja da Dodge, mas lembro bem das poucas vezes em que fui até lá. Lembro de um Magnum 79, vermelho Alcazar, na vitrine, lindo!
Este, foi comprado por um grande empresário de Taquara, e também, prefeito da cidade por duas vezes! Certa vez, estava eu andando de bicicléta, encontrei este Magnum parado em frente a um supermercado, o empresário estava dentro do carro. Fui até lá e puxei conversa com ele. Lembro que eu estava embasbacado com a belezado do carro, e só fazia elogios ao mesmo. Ele me disse: "-Realmente, o carro é muito bonito e bom, mas não dá para andar muito, gasta muita gasolina." Saí dali pensando, putz, o cara é cheio do dinheiro, um dos homens mais ricos da cidade e é miserável!!!
Este senhor tinha quase uma coleção de carros, galaxies eu lembro que tinha dois! Bom, ele ficou por alguns anos com o carro, quase não saia com ele. Quando o vendeu, em meados da década de oitenta, tinha apenas 22mil km. Este carro foi para a cidade de Caxias do Sul-RS.
Lembro também de um LeBaron azul estelar, lindo, lindo, lindo!! Este foi comprado por um médico neurologista aqui da cidade. Para mim a cor mais bonita de todas.
Quando a Chrysler foi comprada pela VW, seu proprietário mudou a bandeira para FIAT. Hoje , infelizmente nem o prédio existe mais, conforme foto abaixo.
 |
Aqui ficava o prédio da revenda Dodge, ficou abandonado por muitos anos, até que o demoliram |
A agência Chevrolet era uma das mais fortes de Taquara e também foi uma das primeiras a se instalar aqui. Tinha sua sede bem no centro da cidade, lugar privilegiado, pois todo mundo passava em frente sua vitrine, os carros novos tinha lugar de destaque. Esta eu conheci bem, por dentro e por fora. Vi muitos Opalas, Comodoros, Diplomatas, e outros, na sua oficina e vitrine. Lembro que em 1979 estavam expostos dois Comodoros brancos, os dois com motor 4100-250S. Um tinha meio teto de vinil bege e o outro não. Um deles foi comprado por um senhor que tinha um estúdio fotográfico no centro de Taquara. Ficou com o carro até 1986, quando o trocou por outro Comodoro 4100 à álcool. Este 79, quando foi vendido, tinha apenas 16mil km, até o senhor fotógrafo se arrependeu de tê-lo vendido. Este carro eu teria com enorme prazer.
Muitos anos depois, quando o fundador da agência já havia falecido, seus herdeiros resolveram construir um novo prédio, mais moderno e maior, Faliram!
 |
Lugar de destaque da agência Chevrolet, bem no centro da cidade. Esquina esta, que passei noites e noites conversando até de madrugada com os amigos |
 |
No vidro da porta de entrada ainda tem o nome do fundador da agência. "Joaquim Steffen & cia ltda". Não sei como os dois herdeiros do sr Joaquim não imploraram por este pedaçinho de vidro. Se fosse do meu pai... |
A agência DKW tinha um local de destaque, lugarzinho acolhedor, prédio bonito. Infelizmente não vejo mais muitas DKWs, mas o prédio continua em pé. Um amigo me contou que brincava dentro desta agência quando guri. Brincavam de esconde-esconde entre as DKWs zero. Palo amor de Deus!!! Quando a Volks comprou a DKW, abandonaram o prédio. Este existe até hoje, já foi loja e supermercado, entre outras coisas. Quando eu era mais novo, sempre tive vontade de montar minha oficina neste lugar, era um sonho!
 |
Prédio da agência DKW, esta muito bem conservado até os dias de hoje. |
 |
Interior da agência DKW-Vemag. Este prédio foi um sonho para mim, rua maravilhosa e prédio histórico. |
A agência Fiat existe até hoje no mesmo lugar, já mudou de dono, mas continua firme.
A agência Willys ficava no centro da cidade, posteriormente mudaram o endereço para a Av Sebastião Amoretti, bem perto onde ficava a Chrysler. Meu pai comprou uma Rural zero nesta agência em 1963. Nunca entrei lá.
A agência Ford também era no centro da cidade, depois foi tranferida para a Av sebastião Amoretti. Tinha um prédio novo e bonito. A vitrine da agência era pequena, entravam poucos carros. Lembo do lançamento do Maverick, já comentei aqui no blog dos dois GTs 1974 na vitrine (um vermelho e o outro amarelo). Lembro também dos inúmeros Galaxies ali expostos. Época em que se faziam carros de verdade. Eu tenho pavor de "bolotas plásticas." Tanto que hoje, meu carro do dia a dia é uma C10 1973. Vou com ela para todos os lugares em que um carro novo vai, mas a grande maioria do carros novos não vão onde eu vou com ela!!
Alguns anos após o fundador desta agência Ford se aposentar, esta, estava falida. Foi então comprada por donos de uma outra agência Ford, do interior do estado. Os novos proprietários chegaram, fizeram muitas mudanças e reformas. Uma destas mudanças foi a de "limpar" todo o material antigo da agência. Eu tinha um amigo que trabalhava lá, este foi o encarregado de jogar tudo fora.
No meio desta limpeza, ele me ligou e disse: Cuti, passa aqui urgente! Tem muita coisa do teu interesse!!" Fui até lá e me apavorei. Tinham caixa e caixas de antiguidades prontas para irem ao lixo. Tinham lanternas de galaxie, maverick, corcel, peças de motor, frisos e milhares de outras coisas, tudo zero!!! Outras pessoas e donos de ferro velhos já estavam carregando coisas, lembro que um cara de um ferro velho pegou uns 200 jogos de pistões do motor 292 do Galaxie/F-100/350/600!!! Tudo novo e jogado fora!!! Minha vontade foi de assaltar o cara e levar tudo!!
Mas, meu amigo tinha separado algumas coisas, que achava que iriam me interessar. Verdadeiras preciosidades!! O brasileiro adora descartar o velho, que mentalidade burra!!! País sem memória, lastimável!!
Olhem só o que arrecadei no lixo da agência Ford:
 |
Catálogo de peças do Ford Corcel I |
 |
Catálogo de peças dos camihões Ford 1970. Editado em portugues. 188 páginas |
 |
Master Parts Catalog-FOMOCO- Tudo que a Ford produziu nos EUA entre os anos de 1939 e 1962. São 6475 páginas, contendo peças numeradas pela Ford. RARIDADE!! Editado em inglês com capa de ferro!! |
 |
Catálogo americano de peças Ford de 1948 até 1954. Editado em inglês com 312 páginas |
 |
Catálogo de peças americano dos caminhões Ford produzidos entre 1948 e 1955. Editado em inglês. 282páginas |
 |
Manual de manutenção dos caminhões Ford produzidos entre 1949 e 1951. Editado em espanhol. 160páginas |
 |
Manual de manutenção dos caminhões Ford, produzidos no ano de 1952. Editado em espanhol com 160 páginas |
 |
Manual de manutenção dos caminhões Ford produzidos no ano de 1953. Editado em espanhol com 157 páginas |
 |
Catálogo de peças dos caminhões Ford produzidos em 1953. Editado em inglês. 375páginas |
 |
Catálogo de peças dos caminhões Ford produzidos em 1956. Editado em inglês. 187páginas |
 |
Catálogo de peças dos caminhões Ford produzidos nos anos de 1956 e 1957. Editado em inglês. 382páginas |
 |
Manual de manutenção dos caminhões Ford produzidos em 1958. Editado em espanhol com 287páginas |
 |
Manual de manutenção dos caminhões Ford produzidos no ano de 1959. Editado em espanhol. 175páginas |
 |
Catálogo de peças dos caminhões Ford brasileiros produzidos nos anos de 1961 até 1971 |
 |
Manual de manutenção das caixas automáticas Ford produzidas nos anos de 1956 e 1957. Editado em espanhol. 112páginas |
 |
Catálogo de peças dos carros e caminhões Ford produzidos entre os anos de 1928 e 1936. Editado em português. 99páginas |
 |
Antiga agência Ford de Taquara |
 |
De outro ângulo. Olhando os carros à venda, me fazem lembrar os Galaxies e Mavericks zero na vitrine |
Acabei por ganhar algum dinheiro com estes manuais, várias pessoas e clientes me encomendavam cópias, então comecei a vender algumas, sob encomenda.
Charger RT 1972
Este dodge foi todo reformado no final dos anos 80, era de um cliente de Porto Alegre. Este, tinha um sítio perto da cidade de São Francisco de Paula, praticamente passava na minha oficina todas as quintas feiras.
Como era de costume nas décadas passadas, muitos donos de dodge atualizavam seus carros, este foi um caso. Quando este meu cliente o comprou, início da década de oitenta, o carro já estava com a frente do 75. Os bancos também foram trocados por modelos de encosto alto.
Com o passar do anos, meu cliente me procurou para que eu reformasse o dodge. No andar da reforma, descobri que ele tinha em casa a frente original do 72, mas apesar da minha insistência, não quis que fosse recolocada. Disse-me ele que assim como estava era muito mais bonito e atual. Então o carro ficou como estava.
Esta foto abaixo, foi me entregue pelo meu cliente, algum tempo depois de eu te-lo reformado.
 |
Foto me entregue pelo antigo dono, infelizmente as duas outras que ganhei do carro acidentado, sumiram! |
Um ano após a pintura do carro ter sido feita, meu cliente se acidentou com o carro. Estava fazendo uma viagem ao Uruguai, um dos pneus traseiros estourou. O carro saiu da estrada e virou dentro de um enorme depressão que havia ao lado da estrada. Meu cliente saiu ileso no acidente, mas o charger ficou bem destruido. Toda a lateral direita, a capóta e o capô ficaram muito amassados.
Uma semana depois do acidente, meu cliente apareceu na oficina para que eu fosse até o sítio, desse uma olhada no carro e um orçamento da reforma. Quando vi o estado do coitado, desanimei! Depois de muito conversarmos, convenci o meu cliente a comprar outro dodge. Naquela época, os preços dos dodges eram muito baixos, não tinha como não comparar com o preço que iria ficar a reforma. Daria para se comprar uns três ou quatro dodges.
Alguns dias depois, meu cliente apareceu na oficina com um Magnum 1979 , branco, impecavelmente novo. Me agradeceu pelo conselho de não reformar o 72, pois pagou pelo novo dodge bem menos que custaria a reforma do 72.
No mesmo dia, me pediu para buscar o charger no sítio. Me vendeu o carro sem ao menos acertarmos o preço. Paguei apenas alguns trocados pelo charger, e mais algumas arrumações futuras no Magnum. Além do charger, meu cliente me entregou as peças originais do 72, como a grade, os bancos e lanternas.
Na minha próxima postagem conto a história de um Charger R/T 1978 azul Capri