Quando meu pai chegou em casa e me disse ter encontrado um caminhão Ford F-350 abandonado, logo tratei de ir dar uma olhada. O Ford estava encostado ao lado de uma casa em uma propriedade rural, localidade de Santa Cristina do Pinhal, distrito de Taquara. Dava para ser avistado da estrada, tinha cor vermelha e os logotipos Coca-Cola gravado nas portas. Bati palmas e logo veio uma senhora me atender, era a sogra do dono do Ford, falei a ela que tinha interesse na compra do F-350, então ela foi chama-lo. Logo após me apresentar, minha primeira prioridade era olhar por baixo do capô, tinha que ter o motorV8 acomodado em seu lugar. Depois de confirmado o motor, olharia o estado geral do F-350. A confirmação veio em seguida para a minha alegria, mas sem demostra-la, o Ford ainda tinha o V8.
![]() |
FOTO TIRADA NA FRENTE DA CASA DOS MEUS PAIS, NA DIREÇÃO DO F-350 MEU SOBRINHO LUCAS. O OPALA COMODORO 1985 QUE MEU PAI ESTÁ LAVANDO TINHA ALGUNS MESES DE USO |
A grande maioria destes motores foram banidos nas décadas de oitenta e noventa para darem lugar aos detestáveis Perkins. Porque as pessoas achavam um grande negócio ter um diesel, claro que em se tratando de economia não tem comparação com o V8.
Portanto tratei de parecer inconformado com o motor V8, claro, para depreciar o máximo o Ford F-350.
O proprietário, que não lembro mais o nome, era um antigo funcionário da Coca-Cola em Porto Alegre, disse-me ele que quando se aposentou comprou o caminhão em um leilão de renovação de frota da empresa, andou por alguns anos no sítio e arredores de Taquara e depois abandonou o Ford.
Fiquei, e fico até hoje, imaginando o que este Ford levou de pau nas ruas e estradas da região metropolitana de Porto Alegre nos anos sessenta e setenta. Imaginem ele carregado de engradados de bebida, subindo ladeiras e morros, o motorzão V8 zunindo, e por vezes, até apanhando de tanta carga. Só quem viu um V8 Ford F100 , F350 ou F600 trabalhando, sabe do que estou falando. O ronco deles é inconfundível.
![]() |
CAMINHÃO NA ENTRADA DA GARAGEM, COM DODGE NA FRENTE |
As minha mais remotas lembranças deles foram:
- Uma F100 V8 ambulância do antigo INPS.
- Um F600 V8 do corpo de bombeiros
- Um F600 V8 da prefeitura, que passava todos os dias em frente a minha casa. Quando ele entrava na rua eu já sabia, porque o motorista andava sempre com o pé em baixo. Que ronco!!! Nunca vou esquecer destas cenas. Todos os três mencionados foram do município de Taquara.
Segundo me contou um ex proprietário de um Ford F600 V8, que anos atrás trabalhava transportando pedras das pedreiras do interior de Taquara para outras cidades do estado, os F600 a gasolina eram os preferidos pelos camioneiros, dificilmente não subia alguma pirambeira e na estrada era um rei, rápido e gostoso de dirigir. Só que tinha dois defeitos grandes: O primeiro era que tinha de se ter muito cuidado para não entortar o eixo cardãn, o motor tinha tanta força que se com o caminhão carregado, ele fosse forçado em arrancadas em lombas ou acavalado, o eixo virava um espiral. O segundo grande defeito era que na estrada, quando avistava um posto de gasolina, a direção começava a puxar para o lado do posto(Brincadeira).
![]() |
ESTAS FOTOS FORAM TIRADAS LOGO QUE O F-350 FICOU PRONTO, NÃO TINHA AINDA O MOTOR 318' DE DODGE NA TRASEIRA |
Bom voltando ao meu Ford F350, levei o dia todo para fazer o caminhão funcionar, mas funcionou bonito. Cheio de folgas e muito surrado, mas funcionando. Acertamos o preço e peguei a rodovia RS20, que liga Taquara a Porto Alegre e fui em direção a minha casa, distante em torno de 20 km . Documentação totalmente irregular, pneus carecas, freio deficiênte, entre tantas outras coisas fui seguindo pela estrada, feliz da vida com o F350-V8. Era uma época diferente da de hoje, muito mais descomplicada, não se tinha a preocupação de andar "meio" irregular.
Como eu suspeitava, o Ford tinha sido bem surrado, o motor tinha as medidas de pistão 0.60 e bielas 0.30, ficando impossível a reforma do mesmo. Acebei comprando outro motor e reformando por compléto.
![]() |
FOTO TIRADA DA JANELA DA COZINHA DA MINHA MÃE |
Depois de muito pensar e pensar, tinha decidido pinta-lo de bordô, após alguns testes de cor que não me agradaram, acabei escolhendo a cor certa. Pintei de um amarelo bem clarinho, ficou sensacional. Mas depois , por pura inexperiência, tive uma grande dor de cabeça para regularizar a documentação. Deixei para fazer a papelada depois de pronto, pintado. deveria ter pedido uma autorização para a troca de cor antes da reforma. Lá foi meu pai de novo resolver uma pendenga.
Resolvido isto, a restauração do Ford levou exatamente um ano para ser concluida, foi muita dedicação e muito trabalho para deixá-lo novo, mas valeu a pena.
Como já tinha dito antes, a minha intenção era fazer um guincho, por isto o Ford não tinha carroceria atras, estava só no chassi. Então, para adicionar peso a traseira e deixá-lo mais macio para rodar, provisoriamente fiz um estrado de madeira e coloquei em cima um motor 318-V8 de Dodge, completo, com bomba dágua e de gasolina, capa seca, motor de arranque, carburador e tudo mais. Ficou razoavelmente mais macia a suspensão traseira, bom para rodar nas ruas irregulares de paralelepípedos.
A escolha de colocar um motor V8 na traseira ficou sensacional, uma coisa bem diferente do que se estava acostumado a ver, chamava muita atenção aquele motorzão V8 acoplado na traseira. Não imaginava eu que aquela idéia iria dar tanto o que falar em Taquara. Foi inventado, não sei por quem, que eu tinha instalado dois motores V8 no F-350, um funcionava na tração dianteira e outro na traseira, portanto um Ford F350 V16. E pasmem, tinha gente que vinha me perguntar com era o funcionamento . Eu e meus amigos quase morriamos de rir, é por isto que eu acredito que tantas pessoas são enganadas em se tratando de carros antigos. O ser humano acredita em tudo que escuta!!
![]() |
FOTO TIRADA NA CASA DOS MEUS PAIS. NA FRENTE DO FORD UM DODGE DE UM CLIENTE |
Passados poucos meses e depois de milhares de propostas de compra do F350, acabei aceitando, e com muito pesar, passei ele adiante. Logo que o Ford ficou pronto, comprei um Charger R/T 1977 automático branco, muito inteiro, que contarei na próxima postagem.