sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Dodge Dart 1975 Prata Lunar

                        Certa feita, no início dos anos noventa, estava levando um dodge Charger à um cliente de Porto Alegre, depois de ter feito sua revisão. Passando em frente à uma revenda avistei de longe uma convidativa placa afixada no vidro parabrisa de um Dart:"BARBADA". Não resisti e encostei o Charger que estava indo entregar ao cliente e fui olhar o Dart de perto.
                        Era um carro muito bom, bem estruturado e com uma pintura boa. Depois de bem examinar o carro, entrei na salinha, de onde o vendedor já me espiava, para perguntar o preço. Lembro como se fosse hoje, com o preço da mão de obra que iria receber do Charger que entregaria em seguida, daria para comprar o novo carro. Logo pensei que não precisaria retornar à Taquara de onibus!! Bom, após uma conversa rápida com o vendedor, acertei com este que iria voltar no mesmo dia para levar o carro, e assim fiz. Entrei no Charger e segui direto ao endereço do proprietário para entrega-lo. Feito isto, peguei um taxi e fui a uma agência do Banco do Brasil descontar o cheque que tinha recebido do cliente, em seguida retornei ao picareta. Chegando lá fechei a compra e uma hora depois estava na estrada, retornando à Taquara com mais um Dodge no currículo.
                       Alguns dias depois, com o carro já revisado, resolvemos eu, meu irmão Diogo e mais dois amigos, ir à Argentina, via Uruguaiana, com este Dart. Uma viagem programada de mais ou menos 1000Km, só de ida. Saímos antes do amanhecer de Taquara, com perspectiva de chegada ao nosso destino no final da noite do mesmo dia.
                      No decorrer daquela manhã, a viagem transcorria normalmente, com paradas exclusivas para alguns cafés e abastecimento. O Dartão andava bem, tinha um tremendo de um motorzão redondo, era estável e transmitia uma boa segurança aos ocupantes.
                        Lá pelas tantas, em torno de 400quilômetros de viajem, depois de termos passado pala cidade de São Sepé, já perto da cidade de São Gabriel, acertei em cheio um buraco do asfalto. Ou melhor, mais que um buraco, era quase uma cratera!!. Deu um baita de um solavanco!! De cara, acendeu a luz da bateria no painel, indicando que o alternador tinha parado de carregar. Parei o Dodge no acostamento, abri o capô para dar uma olhada. Correia no lugar, os fios do rele idem, aparentemente tudo certo. Soltei o cabo positivo da bateria, para fazer um teste, o motor morreu!! O alternador não estava carregando a bateria!
                        Nas nossas viagens, eu sempre levava um grande aparato de peças junto, desta vez, inclusive um alternador já revisado e um rele novo. Como aquele lugar era descampado, quase um deserto, resolvemos seguir viagem até encontrar  o próximo posto de combustível para tentar resolver o problema. Uns 40Km depois avistamos um de longe. Chegando lá, completei o tanque de gasolina e encostamos em frente à uma lancheria. Enquanto meus parceiros foram tomar café e se encherem de pastéis, fui tentar descobrir o defeito. Primeiro tirei o altenador do carro e o troquei! Nada, a luz continuava acesa. Parti para o rele e o troquei também!! Nada!!
                       Parece incrível, mas quando a gente está  nervoso, o cérebro não funciona!! Na hora, não sabia mais o que fazer! Estava atucanado!! Então , a melhor coisa a fazer é relaxar, fui para a lancheria tomar um café e expliquei o fato aos parceiros e lhes disse que precisávamos de uma auto-elétrica!!
                        Naquela época, assim como ainda hoje é, aquelas bandas eram muito ermas. Os retões da BR290 são intermináveis, com apenas alguns postos de gasolina de tantos em tantos quilômetros. Bueno, depois do café, indaguei o frentista do posto se sabia de alguma oficina elétrica por aquelas bandas. Este respondeu que mais alguns quilômetros à frente tinha um rapaz que fazia consertos em casa, portanto, uma pequena oficina! Esta, ficava na beira da estrada deserta e seria fácil de ver.
                        Bom, seguimos viagem! Eu só olhando e pensando naquela luz vermelha do painel de instrumentos e cuidando para não passar do ponto onde estaria a tal oficina. Lá pelas tantas, vimos uma placa indicando: "Auto-Elétrica"! Paramos em frente e eu me decepcionei, o cara tinha meia duzia de ferramentas em uma garagem de madeira, caindo!! Pensei comigo, este cara não sabe nada!! Mas , sem outra alternativa, entramos. Expliquei o caso ao rapaz! Este, abriu o capô, deu uma olhada nos fios, em seguida tirou a tampa da caixa de fusíveis, puxou um pra fora, olhou e atirou o fisível longe!! Entrou na garagem e em instantes veio com um novo fusível, colocou no lugar e mandou eu ligar o carro. Entrei bati arranque, olhei o painel e...!!! Putz, o cara tapou minha boca!!!
                            Moral da história: Não despreze ninguém, principalmente pelo seu aspecto!! Sempre tem alguém que sabe mais do que tu!! Todos me olharam, deram uma risadinha e não falaram nada. Eu com a cara no chão!! Bom, perguntei ao cara quanto lhe deviamos, este disse:"-Nada!! Não deu trabalho nenhum! Abri a carteira e dei à ele uma nota, acho que no dinheiro de hoje , R$50,00. Agradeci, entramos no carro e saimos fedendo!! Pé na estrada novamente!     
                          Agora descansados e sem preocupações nenhuma só curtiamos a viagem. Uns 100km depois, se aproximando da cidade de Rosário do Sul, quase meio dia, estrada praticamente deserta, ponteiro do velocímetro sempre em torno do 160/170Km/h varando as intermináveis retas da BR290, estavamos fazendo um ultrapassagem em um caminhão, quando derrepente, um estouro!!  Simultâneamente ao estouro, se ergueu no ar uma fumaceira terrível e o Dodge pendeu a suspensão dianteira, lado esquerdo! 
                        Todos nós naquele momento, se segurando como podiamos dentro do Dodge, pensamos apreensivos, que um pneu havia estourado!! Inacreditavelmente, o carro manteve uma razoável trajetória, sendo possível sua dirigibilidade. Não consegui direcionar a tragetória natural, que seria de tentar voltar ao lado direito da pista e procurar parar no acostamento. Fui diminuido a velocidade, e o dodge foi parando no acostamento oposto, ou seja, lado esquerdo, na contramão.
                        O caminhão que ultrapassava-mos no momento do estouro, vendo a fumaceira que levantou, também diminuiu a velocidade e, assim que paramos, ele parou ao nosso lado. Descemos do carro atônitos, quase saindo pelas janelas. Quando olhamos para a roda dianteira esquerda, inacreditavelmente, não tinha mais roda!!!
                        O Dodge estava equipado com as famosas (na época) rodas gaúchas. Simplesmente a única parte da roda que estava no carro, era o miolo, onde ficam os parafusos de fixação!  A roda se quebrou e voou em mil pedaços!! O pneu ficou encaixado dentro da balança inferior, triturado!!
                        Perpléxos, olhamos para trás, para a trajetória do carro. O asfalto tinha uma grande marca, por dezenas, acho que centenas, de metros. O caminhoneiro desceu do caminhão e veio nos prestar ajuda, também não acreditava no que tinha presenciado. Disse ele que tinha nos visto logo que aparecemos no seu espelho retrovisor. Tinha comentado com seu ajudante:"-Vai passar um Dodge por nós, em alta velocidade!!" Os dois, por alguns instantes, acompanhavam a nossa alucinada trajetória. Disse que logo que passamos por eles, viram quando o carro deu um grande estouro e a guinada na suspensão! Pensaram eles, que iriamos capotar!!
                         Bom, conversa vai e vem, eu meio apavorado, fomos avaliar os estragos. Não podia acreditar e pensar que estaríamos empenhados a 500km de casa. Mas... Dodge é Dodge!! Além da roda e do pneu, por mais incrível que possa parecer, não estragou mais nada! Apenas o disco do freio ficou um pouco lixado. Tudo isto graças a sorte que tivemos de o pneu se encaixar na balança e no disco de freio. Uma parte do pneu se encaixou no disco e amorteceu o atrito entre este e o asfalto.Tirei o miolo da roda, que ainda estava grudado nos parafusos, arranquei o protetor do disco do freio, que estava todo torto, coloquei o estepe e seguimos viagem! 
                         Paramos na primeira churrascaria que apareceu na estrada, precisávamos celebrar a vida!!! Lembro que tomamos várias caipiras e depois nos entupimos de carne! As conversas somente giravam em torno do ocorrido, e certamente, todo o nosso infortúnio tinha acontecido por conta daquele bendito buraco no asfalto. Apesar de tudo, estávamos felizes, muito felizes!! Por estarmos todos juntos e com a saúde perfeita.
                          Bom, depois de uma hora e meia, retomamos à viagem. Agora sem estepe, e ainda com uma longa jornada pela frente. Sem contar a volta!! Nunca rimos tanto de uma coisa ruim como naquele dia.
                          Chegando na cidade de Uruguaiana, divisa entre Brasil e Argentina, fomos até a sede da Polícia Federal e procuramos pelo agente Marcos Rahmeier.  Um primo nosso, hoje aposentado, que trabalhava no setor de contrabando e tráfico de armas. Logo que o encontramos, este ficou surpreso com nossa aparição!! Contamos o ocorrido a ele e falamos que precisávamos de uma roda e um pneu para o Dodge!! Ele pensou um pouco e prontamente ligou para um amigo que conhecia. Conversou por alguns instantes com este sujeito e desligou.
                          Cerca de meia hora depois, apareceu um sujeito argentino montado em uma pequena moto, parecia uma daquelas cinquentinhas da Yamaha. Este conversou com nosso primo e foi embora. O Marcos olhou para nós e disse:"-Vamos buscar uma roda de Dodge !!"
                          Entramos no carro, atravessamos a fronteira do Brasil e fomos todos para a cidade Argentina de Passo de Los Libres. Chegando lá, fomos guiados pelo nosso primo até uma casa na periferia da cidade. Ao chegar na casa, quem nos atendeu foi  um Argentino, de uns cinquenta anos. O cara foi muito amigável, logo nos convidou para entrar. Quando entramos no pátio da casa, quase infartei e caí duro!! Tinham 4 dodges brasileiros atirados no gramado!!! Três Chargers e um Dart! 
                          Na época fiquei bem embasbacado com a visão, os carros estavam parados e pareciam ser doadores de peças, mas eram inteiros e razoávelmente bons! No fundo do pátio da casa, havia um grande galpão e o argentino nos convidou e entramos todos na garagem, tive mais um baque!! O galpão estava repleto de peças de carros, tudo antigo!! Logo em seguida o argentino tirou de baixo de uma pilha de peças uma roda de dodge, com pneu e tudo, e nos entregou. Eu estava perplexo!!!
                      Conversamos um pouco e perguntei ao homem se trabalhava com desmanche de carros e venda de peças, este me disse que não!! Aquilo tudo era seu hoby e não negociava peças nem carros! Perguntei quantos pesos iria nos pedir pela roda?? Ele prontamente ascenou negativamente com as duas mãos dizendo nada, nada!! A roda foi um presente!!
                          Conversamos por mais algum tempo, lhe perguntei dos dodges. Ele não quis falar muito à respeito deles, só me deu a entender que estavam com situação legal e emplacados na Argentina, agradecemos e fomos embora.
                          Nesta altura, já era final de tarde, estava quase anoitecendo, então resolvemos voltar para a cidade de Uruguaiana, no lado brasileiro. Passamos à noite em um hotel e na madrugada do dia seguinte levantamos os panos e seguimos viagem. Ao meio dia chegamos ao nosso destino. Fizemos nossas compras e retornamos ao Brasil. Nada mais de relevante aconteceu na nossa viagem, além do prazer inenarrável de viajar a bordo de um Dodge Dart em grandes viagens!
                          Algum tempo depois, vendi este Dart para um sujeito de Canoas , do qual nunca mais tive notícias. Uns três ou quatro meses atrás, encontrei em um bar aqui de Taquara, um chapeador que disse estar reformando um Dodge. Este me disse que o seu atual dono tinha lhe dito que este carro foi meu. Eu perguntei ao chapeador por mais detalhes do carro, que dodge era? que modelo? cor? e tal! Mas este, não soube me dizer, apenas sabia que era um dodge!! Não sabia nem a cor, pois o carro tinha sido todo jateado. Marquei com ele e alguns dias depois fui até a oficina dele olhar o dodge.


                         Em um primeiro momento não reconheci o carro, então, anotei os dados da plaqueta e fui conferir no meu "banco de dados", e...foi meu mesmo! Não podia imaginar que este carro estaria vivo ainda, mas , apesar de ser um Dart, sobreviveu!! Logo pensei que um carro com uma história bem marcante comigo, assim como narrei acima, poderia ser meu novamente. Tentei negociar o carro alguns dias atrás, mas o seu atual proprietário me pediu R$8mil. Sem motor, sem caixa, sem frisos, lanternas, bancos, etc, etc. Achei pesado o preço! Além de que fizeram uma coisa que eu condeno veementemente. Jatearam toda a lataria do carro para tirar a tinta e alguns podres. A lataria ficou bastante ondulada, não vai ser fácil alinha-lo! Mas, valeu o registro! Acho que este ainda vai viver por mais algum tempo.

               
                                          Na próxima postagem  Dodge Magnum, 1979 bege Cashmere